12 mar 2011

JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE: JUSTIÇA OU INJUSTIÇA?

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Caros leitores.Hoje fugirei um pouco dos assuntos diretamente ligados às Perícias Médicas e à Medicina do Trabalho, e enfocarei brevemente um assunto mais ligado ao “Direito da Saúde”. Imagino que todos aqui estejam acompanhando no Brasil aquilo que é chamado de “Judicialização da Saúde”. O tema está em alta, bem inflamado.

Mas o que é “Judicialização da Saúde”?

De forma hiper simplificada, “Judicialização da Saúde” ou “Judicialização da Assistência Farmacêutica” é quando o Poder Judiciário, através de pedidos da população em geral, se vê provocado a coagir a Administração Pública a cumprir o dever que a Constituição lhe impõe (em especial, em seu Art. 196), garantindo, assim, o exercício do direito à Saúde.

Nesse ponto, enalteço o relevante papel do Poder Judiciário, cada vez mais proativo na defesa das garantias constitucionais. No entanto, quando o assunto é saúde, esse papel merece estar fundamentado em conhecimentos que vão bem além do Direito. É preciso que o Judiciário saiba, com a maior riqueza de detalhes possível, como está operando o atual sistema de saúde no Brasil: a falta (e lamentáveis desvios) de recursos; as péssimas condições de trabalho dos profissionais das áreas da saúde (uma das áreas em que o índice de doenças ocupacionais é o mais elevado, conforme dados previdenciários); a falta de leitos físicos para internações (enfermarias, UTIs, etc.); a falta de uma lei que obrigue o compromisso social por parte dos famigerados fornecedores de insumos (materiais hospitalares, medicamentos, etc.), sob pena de nunca haver recursos suficientes para resolver o problema da saúde no Brasil; enfim, os olhares do Judiciário devem múltiplos. Não é nada fácil.

Enquanto isso, talvez já fazendo parte da natural curva de aprendizado dos magistrados, algumas decisões judiciais tem gerado tristes repercussões coletivas.

Ninguém ousa dizer que determinado paciente grave não necessite de medicação específica, muitas vezes de alto custo. Como o Estado tem a responsabilidade constitucional de cuidar da saúde desse e de todos os pacientes, pode (como vem ocorrendo com demasiada freqüência) o juiz arbitrar que o Poder Público custeie essa medicação. O paciente então, de forma justa se beneficiou. Mas já pararam pra pensar que os elevados custos de um tratamento crônico de um único paciente podem se equivaler aos custos da compra de vacinas para imunizar uma cidade inteira, por exemplo?

Alguém que necessite de um leito de UTI, certamente poderá (como tem ocorrido) conseguir mediante ordem judicial, essa internação. Mas qual leito será desocupado para que esse mandado seja cumprido? Já pararam pra pensar que a mesma ordem judicial de “vida” para um paciente, pode então, significar uma ordem judicial de “morte” para outro paciente (que deixará o leito da UTI)?

Segundo relatos muito confiáveis, num hospital psiquiátrico de São Paulo, as internações compulsórias (mediante ordem judicial, muitas vezes sem nenhum amparo técnico como exige a própria lei relativa à saúde mental) estão ocorrendo, em média, uma vez por semana (sobretudo, em função da dependência do crack). Pergunta natural: para onde estão indo aqueles pacientes que deram lugar a essas novas internações? São potenciais suicidas, pacientes em surtos psicóticos deflagrados, etc., que certamente representam riscos para sociedade e para eles próprios.

Senhores magistrados, mesmo imbuídos das melhores das intenções, perceberam como aquilo que chamaram de “justiça” através dos mandados que expediram, pode também estar sendo a maior de todas as injustiças para com os que por esses mesmos mandados padeceram?

Nesse contexto, vejo o desespero de muitos bons médicos, que querem fazer a coisa certa. Vejo também o desespero de muitos bons magistrados, promotores, etc., que também querem fazer a coisa certa. Pra completar o cenário, vejo como lamentável pano de fundo, além da patente ineficácia do Estado, a ignorância da maioria dos operadores do Direito com relação à prática médica, e com recíproca verdadeira.

Duas ciências maravilhosas: Direito e Medicina. Tão importantes, tão ricas, tão necessárias… ao mesmo tempo tão distantes no necessário conhecimento uma da outra.

Muitos autos sobre o tema estarão conclusos aos magistrados nos próximos anos, fazendo com que eles “quebrem a cabeça” para dar uma boa solução aos casos. Dr. Médico, está com dúvida sobre o que são “autos conclusos”?

O prognóstico do futuro ainda é reservado quanto ao tema “Judicialização da Saúde”. Dr. Operador do Direito, está com dúvida sobre o que é “prognóstico reservado”?

É… precisamos nos aproximar.

Um forte abraço a todos!

Marcos H. Mendanha
Twitter: marcoshmendanha
E-mail: marcos@asmetro.com.br
Sugestão de leitura: “Gastos do governo com remédios via ação judicial cresce 5000% em 6 anos”. Confira texto completo em: http://bit.ly/lMVNyy

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