Como toda ação gera uma reação, confesso que dentre as alterações propostas pela nobre Corte, algumas me preocupam.
1. Mulher que fica gestante no contrato de experiência tem direito a estabilidade?
Até 14/09/2012, o TST entendia que não. Agora mudou. Independente do tipo de contrato (se por tempo determinado – onde entra o contrato de experiência – ou por tempo indeterminado), o direito à estabilidade está garantido.
Como era o entendimento do TST:
Súmula 244, inciso III (antiga redação): “Não há direito da empregada gestante à estabilidade provisória na hipótese de admissão mediante contrato de experiência, visto que a extinção da relação de emprego, em face do término do prazo, não constitui dispensa arbitrária ou sem justa causa.”
Como é o entendimento do TST agora:
Súmula 244, inciso III (atual redação): “A empregada gestante tem direito à estabilidade provisória prevista no art.10, inciso II, alínea b, do ADCT, mesmo na hipótese de admissão mediante contrato por tempo determinado.”
Falemos de algumas consequências previstas. Todos nós sabemos que, especialmente, a partir de outubro (com a proximidade das festas natalinas) o comércio absorve vários trabalhadores temporários (em shoppings, centros comerciais, etc.). Ao contratá-los, os empregadores sabem que a sazonalidade da suas demandas requer aqueles trabalhadores apenas por um certo tempo. Para boa parte dos comerciantes, não há a menor intenção de postergar o contrato após o término do contrato temporário. E isso ocorre, não por má fé do empregador, mas por queda no orçamento da própria empresa após o período festivo, o que é algo compreensível.
O que esse empregador pensará a partir de agora, com o risco de ter que arcar com o salário de uma trabalhadora temporária (gestante) por 14 meses (sendo que sua expectativa e orçamento eram apenas para 3 meses de salário)? Me parece natural e óbvio que, sendo possível, sua preferência de contratação recairá apenas sobre homens, evitando as mulheres.
Serei assumidamente muito maldoso na conjectura que farei: será que no futuro existe possibilidade de algumas mulheres programarem seu início de gestação justamente para o período de seus contratos temporários (ou também nos contratos de experiência)? Explico: se assim fizerem, terão praticamente garantidos 14 meses de salário (sendo 4 deles, não trabalhados, em virtude da justíssima licença-maternidade). Se os empregadores acreditarem nessa maquiavélica possibilidade, ainda que de forma bem remota, mais uma vez qual será a consequência? Tenho por certo que será a diminuição pela preferência das mulheres no ato de suas contratações.
Enfim, de uma forma geral, me preocupa a nova Súmula 244, inciso III, do TST. Muitas mulheres hoje comemoram essa mudança… mas será que num longo prazo haverá mesmo motivos pra essa comemoração? Torço (sinceramente) para que sim. O futuro nos dirá.
2. Empregado portador de HIV e/ou doença grave (que suscite estigma ou preconceito) tem direito a estabilidade (mesmo que a doença não guarde nenhuma relação com o trabalho)?
Agora, o entendimento do TST, pacificado desde 14/09/2012, é o seguinte:
DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO. Presume‐se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato o empregado tem direito à reintegração no emprego.
Sendo assim, a partir de agora, o empregado portador de HIV e/ou doença grave (que suscite estigma ou preconceito) tem sim presumido o direito à estabilidade (mesmo que a doença não guarde nenhuma relação com o trabalho).
Algumas questões nos sobreveem:
· qual o critério para dizer que uma doença é capaz de gerar estigma ou preconceito? Uma diabetes gera preconceito? Uma doença de pele qualquer gera estigma? Uma conjuntivite gera preconceito? Alcoolismo e obesidade são doenças estigmatizantes? Até onde vai o conceito do que vem a ser estigmatizante ou digno de preconceito? Na visão dos julgadores, uma depressão é uma doença (sempre) grave? Como os juízes conceituam “doença grave”?
· Em qual faixa etária incide a maior parte das doenças graves (crônicas, degenerativas, etc.)? Acima dos 40 anos. Assim, sem muito esforço, podemos prever com alguma segurança o que acontecerá, daqui pra frente, com o volume de contratações de trabalhadores com idade acima de 40 anos: uma lamentável redução. Outra coisa eu também posso prever (com pouca chance de errar): os advogados (especialmente os que atuam ao lado dos empregados) tentarão reintegrar (e obter indenizações para) muito mais gente a partir de agora.
· Imaginem: após a consolidação dessas mudanças jurisprudenciais do TST, como serão os processos de seleção nas empresas? Estou convicto que haverá uma rigidez maior nos testes e exames médicos admissionais (inclusive com uma enormidade crescente de exames complementares)… e não demora. Médicos do Trabalho e “Médicos Examinadores” serão cada vez mais assediados no sentido de não permitirem que trabalhadores doentes (independente da doença e da gravidade) sejam considerados aptos ao trabalho.
3. O empregado que sofre acidente de trabalho no período de experiência tem direito à estabilidade de pelo menos 12 meses, prevista no art. 118 da Lei 8.213/91?
R.: Até então, o posicionamento majoritário (embora não pacificado) dos juízes já era no sentido da concessão dessa estabilidade ao empregado acidentado. A partir de agora, isso está sedimentado, e essa é a regra a ser seguida pelo TST.
O tema foi abordado na Súmula n. 378, que ganhou o inciso III: “O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza da garantia provisória de emprego, decorrente de acidente de trabalho, prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/1991.”
Provavelmente, um dos setores mais impactados por essa nova jurisprudência será o da construção civil (um dos setores que mais empregam no Brasil). Lá, a rotatividade dos empregados é muito alta, e muitos não ultrapassam os 3 meses de contrato (período de experiência). Se por um lado esse novo inciso fará com que os empregadores, de uma forma geral, levem as normas de segurança e saúde no trabalho com mais seriedade (o que é ótimo), por outro lado, temo pela redução no volume de contratações.
A lógica é simples, senão vejamos: se os acidentes de trabalho podem ocorrer com todos, e gerar estabilidade, independente de culpa do empregador, estatisticamente, quanto menos trabalhadores existirem no canteiro de obras, em tese, menor a chance de ocorrência de acidentes. Assim, para o empregador, talvez mais valha investir um pouco mais nos funcionários “já confiáveis” e treinados, e exigir desses um empenho maior, do que contratar mais empregados, com menos experiência (muitos vezes em primeiro emprego), e teoricamente, mais sujeitos à acidentes.
É, meus amigos… na Medicina, toda medicação (ainda que boa) tem seus efeitos colaterais. No Direito, parece não ser tão diferente.
À vontade para seus comentários.
Um forte abraço a todos.
Que Deus nos abençoe.
Marcos Henrique Mendanha
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