Turma adota conclusão diversa sobre fatos apurados em laudo e condena empresa a pagar adicional insalubridade
Nos termos do artigo 436 do Código de Processo Civil, o juiz não está obrigado a dar sua decisão de acordo com as conclusões do laudo pericial, podendo formar sua convicção com base em outros elementos ou fatos provados no processo. Assim, mesmo que a perícia aponte um resultado, o juiz pode discordar dele, desde que apresente fundamentos para tanto.
O recurso examinado pela 2ª Turma do TRT-MG ilustra bem uma situação em que a conclusão do laudo pericial foi rejeitada com base no conjunto probatório dos autos. No caso, o juiz de 1º Grau discordou do entendimento do perito de que o contato do reclamante com o agente frio seria apenas eventual. Considerando o contato intermitente, o magistrado condenou a reclamada, uma grande empresa de processamento de carnes, ao pagamento de adicional de insalubridade, em grau médio, à razão de 20% sobre o salário mínimo legal.
Inconformada com essa decisão, a ré recorreu para o Tribunal insistindo em que a conclusão do laudo deveria prevalecer. Mas os julgadores não deram razão à empregadora. Conforme observou a desembargadora relatora, Deoclécia Amorelli Dias, o próprio laudo apontou que a reclamante tinha como atividades colocar, acondicionar e retirar os produtos perecíveis no interior das câmaras frias três vezes por dia, com tempo médio de um minuto por vez. Outra atividade era fazer a limpeza das câmaras frias, em média, uma vez por semana, com tempo médio de 20 minutos.
Para a magistrada, o contato com o agente físico não se dava apenas de forma eventual, como apontado pelo perito no laudo. Ela lembrou que a Súmula 364 do TST, aplicada por analogia, garante o adicional de periculosidade ao empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Segundo a súmula, o adicional é indevido apenas quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido. Reconhecendo que o contato eventual é o fortuito, a relatora entendeu não ser este o caso do reclamante.
Conforme pontuou a desembargadora, a exposição por tempo extremamente reduzido não pode ser considerada habitual. No caso, além da exposição diária de um minuto, havia uma exposição semanal por 20 minutos. “A exposição da reclamante foi corretamente classificada em primeiro grau como intermitente, ou seja, não contínua”, concluiu no voto.
Em reforço ao entendimento, a desembargadora destacou que três testemunhas deram informações sobre a exposição ao frio em período superior ao constatado pelo perito. Além disso, a prova oral foi contra a versão da reclamada de que fornecia os Equipamentos de Proteção Individual ¿ EPIs necessários e suficientes à proteção da reclamante. Por todos esses motivos, a Turma de julgadores negou provimento ao recurso apresentado pela ré, mantendo a condenação ao pagamento de adicional de insalubridade.
Processo: 0000480-03.2013.5.03.0102 RO
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OPINIÃO DO BLOG SOBRE O TEMA:
Vídeo-aula sobre esse texto:
Prezados leitores.Quando nos defrontamos com questões relativas à insalubridade / periculosidade, comumente nos esbarramos também em perguntas que envolvem a habitualidade (ou não) do trabalho estudado.O que é trabalho habitual (também chamado contínuo ou permanente)?O que é trabalho intermitente?
O que é trabalho eventual?
Atualmente, tais perguntas têm encontrado respostas que muito se baseiam no subjetivismo do examinador, o que é temeroso e quase sempre muito discutível.
Já é quase senso comum que no “trabalho permanente” o obreiro tenha que laborar, se não durante toda a jornada, pelo menos em 90% do seu tempo, em determinado ambiente laboral. Vale questionarmos: qual é a norma vigente que, de forma expressa, dá fundamentação para esse raciocínio? Não conhecemos.
No entanto, a já revogada Portaria do Ministério do Trabalho n. 3.311 / 89 assim colocava em seu item 4.4:
“Do tempo de exposição ao risco: a análise do tempo de exposição traduz a quantidade de exposições em tempo (horas, minutos, segundos) a determinado risco operacional sem proteção, multiplicado pelo número de vezes que esta exposição ocorre ao longo da jornada de trabalho. Assim, se o trabalhador ficar exposto durante 5 minutos, por exemplo, a vapores de amônia, e esta exposição se repete por 5 ou 6 vezes durante a jornada de trabalho, então seu tempo de exposição é de 25 a 30 minutos por dia, o que traduz a eventualidade do fenômeno. Se, entretanto, ele se expõe ao mesmo agente durante 20 minutos e o ciclo se repete por 15 a 20 vezes, passa a exposição total a contar com 300 a 400 minutos por dia de trabalho, o que caracteriza uma situação de intermitência. Se, ainda, a exposição se processa durante quase todo ou todo o dia de trabalho, sem interrupção, diz-se que a exposição é de natureza continua.”
Dessa forma, a revogada Portaria n. 3.311 / 89 ensinava que:
>> até 30 minutos por dia = trabalho eventual;
>> até 400 minutos por dia (próximo de 6 horas e meia) = trabalho intermitente;
>>acima de 400 minutos por dia = trabalho permanente, contínuo ou habitual.
Em porcentagens (considerando uma jornada de 8 horas por dia), teríamos:
>> até 6,25% da jornada diária = trabalho eventual;
>> até 83,34% da jornada diária = trabalho intermitente;
>> acima de 83,34% da jornada diária = trabalho permanente, contínuo ou habitual.
No entanto, a Portaria n. 3.311 / 89 foi revogada pela Portaria do Ministério do Trabalho e Emprego n. 546 / 10, que por sua vez, infelizmente, nada falou sobre o tema.
Nesse “vácuo legal” predominante, entendemos que, apesar de revogada, a Portaria n. 3.311 / 89 merece ser considerada quando o assunto for a definição de trabalho eventual, intermitente e permanente. Trata-se de uma forma menos subjetiva e mais embasada de avaliação.
Merece destaque o conteúdo da Súmula 47 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), que assim coloca:
“O trabalho executado, em caráter intermitente, em condições insalubres, não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional.”
Na mesma esteira, vem a decisão abaixo:
“EMENTA: ADICIONAL DE INSALUBRIDADE. EXPOSIÇÃO INTERMITENTE. SÚMULA 47 DO TST. Nos termos da Súmula 47 do TST, o trabalho executado em condições insalubres, em caráter intermitente, não afasta, só por essa circunstância, o direito à percepção do respectivo adicional. Agravo de instrumento conhecido e desprovido.” (AIRR 5868700-22.2002.5.04.0900)
Pelo texto sumulado, concluímos, por exemplo, que os ministros do TST não obedecem o Anexo 14 da Norma Regulamentadora n. 15, na parte que condiciona a percepção do adicional de insalubridade por risco biológico ao “contato permanente” do trabalhador. Observamos que os julgados do egrégio tribunal, se fundamentados na Súmula n. 47, não excluem o “contato intermitente” da percepção do respectivo adicional.
Para análise da periculosidade, o raciocínio é idêntico. Vejamos a Súmula 364 do TST:
“Faz jus ao adicional de periculosidade o empregado exposto permanentemente ou que, de forma intermitente, sujeita-se a condições de risco. Indevido, apenas, quando o contato dá-se de forma eventual, assim considerado o fortuito, ou o que, sendo habitual, dá-se por tempo extremamente reduzido.”
Em sintonia com essa súmula, observamos o seguinte julgado:
“EMENTA: RECURSO DE REVISTA. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. SÚMULA 364, I/TST. A jurisprudência desta Corte, consubstanciada na Súmula 364, I/TST, é no sentido de que tanto o contato permanente como o intermitente geram o direito ao adicional de periculosidade, Incidência da Súmula 364, I/TST. Recurso de revista provido.” (RR 22 22/1999-721-04-40.4)
Assim, por segurança jurídica de todos os atores envolvidos nesse tema, sugerimos aos profissionais que confeccionam laudos de insalubridade / periculosidade que considerem também as Súmulas 47 e 364 do TST em todos os seus documentos. Abordamos essa sugestão com maior profundidade no texto desse blog que pode ser lido clicando AQUI.
Um forte abraço a todos.
Que Deus nos abençoe.
Marcos Henrique Mendanha