02 jan 2019

Retrospectiva 2018 – Top 06: E-Social e a insegurança jurídica do Médico do Trabalho

postado em: Retrospectiva

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[Esse texto foi publicado aqui no SaudeOcupacional.org em 27/08/2018 e foi o sexto texto mais lido do ano! Releia-o.]

Em janeiro de 2019 começam as exigências relacionadas a Saúde e Segurança do Trabalho no eSocial e, consequentemente, o envio dos eventos relacionados ao cumprimento da legislação relacionada ao tema pelas empresas.

Dentre os eventos de SST temos aqueles que utilizam informações do PCMSO, especialmente o evento S2220 “Monitoramento da Saúde do Trabalhador”, onde consta no Manual de Orientação do e-Social versão 2.4:

“São informados neste evento os resultados da monitoração da saúde do trabalhador cujas atividades envolvam os riscos discriminados nas Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho e Emprego, bem como os demais exames complementares solicitados, a critério médico, buscando verificar as possíveis ocorrências de fatores de risco que, por sua natureza, concentração, intensidade e tempo de exposição, são capazes de causar danos à saúde do trabalhador.”

Ou seja, neste evento do e-Social as empresas terão que enviar os resultados da monitorização biológica realizada em seus empregados, o que nos indica que resultado de exames complementares deverão ser informados.

É isto que consta também no leiautes do e-Social (Leiautes do eSocial – Versão 2.4.02), onde neste evento existe campo para indicação do resultado do exame, com as seguintes possibilidades de resultados: Normal, Alterado, Estável e Agravamento.

Ocorre que o Código de Ética Médica (CEM) é claro ao vedar a possibilidade do médico revelar estes resultados, como podemos observar o que está expresso nos artigos 73 e 76 do CEM (Resolução 1931/09):

“Art. 73. Revelar fato de que tenha conhecimento em virtude do exercício de sua profissão, salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente.

Art. 76. Revelar informações confidenciais obtidas quando do exame médico de trabalhadores, inclusive por exigência dos dirigentes de empresas ou de instituições, salvo se o silêncio puser em risco a saúde dos empregados ou da comunidade.”

Está posta a celeuma!

Quem o médico do trabalho deve seguir? A lei que estabelece a obrigatoriedade das empresas enviarem estas informações ou o Código de Ética Médica?

Mais uma vez temos uma situação de enorme insegurança jurídica para os médicos do trabalho, que serão pressionados pelas empresas para fornecerem estas informações, já que as empresas estarão passiveis de fiscalização e autuação a partir de janeiro de 2019 sobre o envio do evento S-2220 “Monitoramento da Saúde do Trabalhador”.

O e-Social já teve seu inicio adiado por várias vezes, mas agora, parece, realmente entrará em vigor em relação a estes eventos, pois as empresas já estão enviando outros eventos não relacionados a SST.

O cronograma será seguido e em janeiro de 2019 teremos que enviar estes eventos. O que faremos?

Consta no site do Conselho Federal de Medicina Parecer sobre o tema (Parecer CFM 17/15) no qual a Conselheira Rosylane Nascimento das Merces Rocha conclui:

EMENTA: É vedado ao médico a aposição da CID-10 e de resultados dos exames no eSocial, de acordo com o disposto no art. 73 do Código de Ética Médica, devendo ser arguida pelo Conselho Federal de Medicina a inconstitucionalidade do Decreto nº 8373/14 ou sua mudança no âmbito legislativo.

Desta forma, podemos concluir que é entendimento do CFM que o médico não pode enviar estas informações. Mas qual medida efetiva o Conselho Federal de Medicina tomou em relação a esta exigência legal?

O referido parecer é de 2015, sendo que estamos em 2018. O que está sendo efetivamente feito?

Por que tanta demora?

Caso o CFM esteja tomando alguma medida, elas têm que ser mais divulgadas e céleres.

Caso o CFM não tenha feito nada a respeito, alguma atitude precisa ser tomada com urgência!

Nem mesmo uma resolução sobre o tema foi publicada, ao contrário do que ocorreu em relação ao PPP, tema que o CFM publicou a Resolução 1715/2004 onde expressamente vetou o preenchimento de campos que violavam o sigilo médico dos trabalhadores. Neste caso, os médicos do trabalho puderam embasar sua conduta de não preencher os referidos campos na referida resolução.

Estamos a poucos meses desta exigência legal e sem esta informação do resultado do exame complementar o evento S2220 não será validado.

Não há duvidas que os médicos do trabalho serão pressionados pelas empresas a preencherem e fornecerem estas informações, o que acarretará em problemas éticos e jurídicos.

Este tema precisa ser divulgado de forma mais efetiva e ampla e o CFM precisa agir com rapidez, buscando trazer ao médico do trabalho alguma segurança jurídica em sua atuação.

Fato é que daqui a alguns meses, mais uma vez, teremos que tomar uma decisão: ser ético ou cumprir a lei?

Não estamos dando a devida atenção a esta questão, que certamente causará muitos transtornos aos médicos do trabalho.

Espero que o bom senso prevaleça e que tenhamos um desfecho que traga segurança jurídica e profissional a atuação dos médicos do trabalho.

Ética é o conjunto de valores e princípios que nós usamos para decidir as três grandes questões da vida: “Quero?”, “Devo?”, “Posso?”. Tem coisa que eu quero mas não devo, tem coisa que eu devo mas não posso e tem coisa que eu posso mas não quero.” (Mario Sergio Cortella)

Autor: Dr. João Baptista Opitz Neto – Médico do Trabalho, Mestre em Bioética e Biodireito pela UMSA/AR; Especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas; Especialista em Ergonomia; Perito Judicial / Assistente Técnico nas áreas trabalhista, cível e previdenciária. Autor do livro “Perícia Médica no Direito” (Editora Rideel); Colunista do portal SaudeOcupacional.org; Professor e Palestrante nas área de Pericia Médica, Medicina do Trabalho e Meio Ambiente do Trabalho; Diretor do Instituto Paulista de Higiene, Medicina Forense e do Trabalho.

O Dr. João Baptista Opitz Neto escreve periodicamente para o SaudeOcupacional.org, na “Coluna do Opitz”.

Obs.: o texto acima é de autoria do colunista João Baptista Opitz Neto, e não reflete a opinião institucional do SaudeOcupacional.org.

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