Demitido por manifestar opinião contrária ao partido político no poder e por criticar as mazelas na saúde pública do município, um médico de Araçatuba teve reconhecido o direito de ser reintegrado aos quadros da Associação Saúde da Família (ASF). A decisão foi tomada pela 1ª Câmara do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região, que também reduziu de R$ 50 mil para R$ 20 mil o valor da indenização por dano moral a ser paga ao profissional.
O médico trabalhou na ASF com registro em carteira de 11 de abril de 2013 a 15 de dezembro de 2015. Em seu recurso, a associação negou que a dispensa tenha sido “discriminatória” e alegou que “apenas fez uso de seu direito potetastivo de dispensar um empregado sem justa causa e com o pagamento de todas as verbas rescisórias devidas”. A entidade ressaltou o fato de ser pessoa jurídica de direito privado, apartidária, que presta serviços na área de saúde a vários municípios do estado, “independentemente de qual partido ou ideologia comande a gestão executiva municipal”. Quanto ao reclamante, a associação afirmou que ele “sempre externou suas posições políticas sem que isso tenha gerado problema ou mesmo retaliações”.
Para o empregado, a dispensa se deu em razão de seu posicionamento político-ideológico, o qual, à época, era contrário ao da gestão municipal, que mantinha contrato de prestação de serviços na área de saúde com a reclamada (contrato de gestão). Segundo ele, o desligamento se deu “exclusivamente porque denunciou publicamente a mazela em que se encontrava a saúde no município e no País”. Ele ainda argumentou que suas críticas refletiam o que já estava sendo denunciado por grande parte da população.
O médico também defendeu a tese de que a ASF “se curvou aos desejos dos governantes municipais”, que se viram afrontados pelas suas posições políticas, especialmente as apresentadas durante uma palestra que proferiu, a convite de uma agente comunitária de saúde, no dia 11 de dezembro de 2015, dias antes de sua demissão. Na palestra, de tema livre, ele se apresentou como médico e cidadão, e não como representante da associação, e discorreu sobre “Liberdade x Igualdade: O impacto no trabalho de saúde”, com foco no Programa de Melhoria e Qualidade na Atenção Básica desenvolvido pelos municípios com verba do governo federal. Alguns dias depois do evento, foi surpreendido com a dispensa, sob a alegação de ter desrespeitado o código de conduta profissional da associação. Quando perguntou a data da violação ao código, teria sido informado de que “a dispensa não tinha relação com suas atividades de médico, mas, sim, com a palestra proferida”.
Para a relatora do acórdão, desembargadora Larissa Carotta Martins da Silva Scarabelim, não há dúvida de que a dispensa do médico foi “ato discriminatório e, nos termos da CF/88 e da Lei 9029/95, correta a decisão de origem, inclusive quanto à determinação de imediata reintegração do obreiro”. O acórdão ressaltou que “não há nos autos indício de que o obreiro tenha agido de forma discriminatória por razões ideológicas ou políticas”, nem que tenha se pronunciado publicamente em nome da reclamada, ou que tenha utilizado “palavras ou expressões que pudessem ofender, caluniar ou difamar ninguém”, mas “tão somente exercitou seu direito de livre manifestação de seu pensamento”.
Já quanto à ASF, “o que indica o conjunto probatório produzido é que a reclamada assim agiu, ao dispensar um colaborador de reconhecido valor profissional, que era necessário para o cumprimento da manutenção de equipe mínima da UBS, sem que tenha apresentado razão lógica/administrativa para tal dispensa, três dias após ter ele se manifestado contrário à política praticada pelos membros do poder executivo local à época”, concluiu o colegiado.
Sobre o valor da indenização por danos morais, arbitrada pelo Juízo da 3ª Vara do Trabalho de Araçatuba em R$ 50 mil, a Câmara entendeu que ele deveria ser adequado às circunstâncias do caso, “levando-se em consideração inclusive o porte da reclamada, para que guarde relação de proporcionalidade com a extensão do dano e atinja a finalidade pedagógica da indenização”, e, nesse sentido, reduziu-o para R$ 20 mil, valor “mais razoável”.
Fonte: TRT-Campinas/SP