No início desta semana um agricultor, de 37 anos, morador da comunidade de Bela Vista, interior do município de São João, foi vítima de um acidente de trabalho. Ele estava colhendo uma lavoura de milho, quando a colheitadeira travou o caracol que puxava o milho para dentro da máquina. Ele saiu da cabine com a colheitadeira ainda em funcionamento e, ao tentar tirar os pés de milho que travavam a máquina, caiu dentro da plataforma tendo o corpo esmagado, morrendo no local.
No ano passado, em toda a região Sudoeste do Paraná, segundo dados do Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho, do Ministério Público do Trabalho, ocorreram 11 mortes em acidentes de trabalho, um aumento de 22% com relação a 2016. O órgão registra 996 afastamentos previdenciários acidentários (redução de 18,5% na mesma comparação) com uma despesa de R$ 5.658.424,40 (retração de 40,3%). A impressão que os dados transmitem, com exceção dos óbitos, é que diminuíram os acidentes de trabalho.
Contudo, segundo dirigentes sindicais ouvidos pela reportagem do Jornal de Beltrão, não é o número de acidentes que está reduzindo, mas as CATs (Comunicações de Acidentes de Trabalho) que estão sendo negligenciadas pelas empresas.
Números não batem
Os números do site do MPT diferem das estatísticas da Vigilância Sanitária de Francisco Beltrão, que registrou no ano passado 28 acidentes graves e quatro óbitos. Dois trabalhadores eletrocutados, um entregador de pizza e um agricultor que morreu esmagado em uma ensiladeira. Enquanto que o site indica apenas uma morte em acidente do trabalho no município.
A inspetora sanitária Dalva Colling, responsável pelo setor de Saúde do Trabalhador, relata que foram notificados 278 acidentes com menos de 15 dias de afastamento, entre os quais 11 de trajeto e 80 com material biológico. Ela informa que ocorrem muitos casos de esmagamento e cortes de dedos, bem como entrada de corpo estranho nos olhos.
Município está atendo
Ela ressalta que há subnotificação, porque muitas empresas levam os trabalhadores em clínicas e hospitais particulares, tentando esconder o acidente com o empregado. Dalva diz que o município está atento aos casos mais graves e tem feito audiências públicas para debater o tema.
“Muitos trabalham acidentados”
No município de Francisco Beltrão foram registrados 954 auxílios-doença por acidente do trabalho no período de 2012 a 2017. O impacto previdenciário dos afastamentos foi de R$ 7.870.014,95, com a perda de 200.998 dias de trabalho.
O setor econômico com mais afastamentos é o de frigoríficos (100), seguido por transporte rodoviário (43) e metalurgia do alumínio e suas ligas (40).
A presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Alimentação, Leonete Santos Ventura, diz que muitos trabalhadores acidentados (naqueles acidentes leves) estão voltando às suas funções após os 15 dias de afastamento pagos pela empresa em virtude da demora do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) em marcar perícias.
“Muitos (trabalhadores) para não entrar no INSS, justamente pela demora, acabam voltando ao serviço. A empresa coloca numa tarefa mais leve, menos perigosa. Há casos em que eles voltam até com pontos nos cortes e cirurgias que têm, muito pela opção do funcionário. Às vezes a pessoa vai esperar 90 dias, 120 dias para a primeira perícia.
Quem que vai sustentar a casa? Tem situações em que só um na família trabalha”, relata Leonete.
“Procuramos reverter este tipo de omissão na justiça”
De acordo com o presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Transporte Rodoviário de Francisco Beltrão e Região (Sitrofab), Josiel Teles, na maioria dos encaminhamentos por acidente de trabalho, as empresas têm se omitido em emitir a CAT. “Eles encaminham como auxílio doença e não como acidente, e aí o INSS não vai saber da urgência daquele encaminhamento. Nós procuramos reverter este tipo de omissão das empresas na justiça. A gente só fica sabendo quando vai fazer uma conversa com o trabalhador que nos conta o que realmente aconteceu.”
O setor de transporte rodoviário é o segundo em afastamentos por acidentes de trabalho em Francisco Beltrão. Além disso, Josiel afirma que há muitos motoristas em tratamento de depressão. Segundo ele, os motoristas estão expostos aos riscos físicos como vibração, ruído, variações térmicas; e também ao stress mental elevado pela fadiga, excesso de jornada, uso de rebites e drogas para não dormir.
“Muitas vezes tem que descarregar e acaba caindo de cima do caminhão. É uma carga muito grande de situações adversas no dia a dia. E quando acontece um acidente de trabalho, infelizmente, as empresas se omitem de encaminhar ele como acidente de trabalho porque aí vai acarretar outro tipo de fiscalização dos órgãos competentes”, lamenta.
Procuradora não acredita em redução de “acidentes”
Luísa Carvalho Rodrigues, procuradora do trabalho do MPT em Pato Branco, informa que os dados do Observatório Digital de Saúde e Segurança do Trabalho são dados da Previdência Social, obtidos mediante acordo de compartilhamento firmado em 2014 com o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e o Ministério da Previdência Social (atualmente Ministério da Fazenda), que participa ativa e construtivamente da validação das informações.
“No entanto, não entendo que tal queda decorra da redução no número de acidentes do trabalho na região, infelizmente.” As denúncias recebidas na Procuradoria do Trabalho no município de Pato Branco, que abrange Francisco Beltrão bem como outros 41 municípios do Sudoeste Paranaense, relacionadas a temas afetos ao ambiente de trabalho aumentaram nos últimos anos. Comparando os anos de 2012 e 2017, houve a dobra das notícias de fato realizadas relatando irregularidades na saúde e segurança no trabalho. Foram 34 denúncias no ano de 2012 ao passo que em 2017 foram 70.
Elevada subnotificação
Além disso, ela observa que não se pode perder de vista que há uma elevada subnotificação dos acidentes do trabalho e doenças ocupacionais, ou seja, não são emitidos os Comunicados de Acidente de Trabalho (CAT) ainda que tenham ocorrido acidentes e/ou os trabalhadores tenham adoecido, em razão das consequências decorrentes da notificação, como, por exemplo, a elevação da alíquota do seguro SAT a ser pago pela empresa. “Ademais, principalmente diante do cenário pós reforma trabalhista, é preciso fazer uma análise dos dados constantes do Observatório. Apesar de os registros de acidente de trabalho em 2017 serem menores que os de 2016, por exemplo, a acidentalidade não mudou, porque, se considerarmos o número médio de empregos com carteira assinada em cada ano analisado, verificamos que o total de acidentes a cada 100 mil trabalhadores formais não caiu, sendo de 1.760 em 2016, e de 1.761 em 2017. Isso significa, na verdade, que há uma redução no número de empregos formais (com a carteira de trabalho assinada) e, consequentemente, na comunicação dos acidentes.”
Sociedade de serviços
Na análise da procuradora do trabalho há que se considerar ainda outro fator, que pode estar influenciando em tais dados que é a contínua mudança da alteração da sociedade industrial para uma sociedade de serviços. “Nas indústrias, é comum a ocorrência de acidentes de trabalho típicos e doenças ocupacionais. Porém, na área de serviços, é mais comum que ocorram doenças ocupacionais, as quais são mais dificilmente reconhecidas.”
2012 a 2017
Dois Vizinhos
No município de Dois Vizinhos foram registrados 648 auxílios-doença por acidente do trabalho no período. O impacto previdenciário dos afastamentos foi de R$ 6.878.375,00, com a perda de 170.709 dias de trabalho.
Pato Branco
No município de Pato Branco foram registrados 1.058 auxílios-doença por acidente do trabalho no período. O impacto previdenciário dos afastamentos foi de R$ 7.401.589,18, com a perda de 170.713 dias de trabalho.
Palmas
No município Palmas foram registrados 1.298 auxílios-doença por acidente do trabalho no período. O impacto previdenciário dos afastamentos foi de R$ 11.218.080,25, com a perda de 297.950 dias de trabalho.
Fonte: Jornal de Beltrão