03 abr 2020

“O marketing na área médica e a utilização da imagem do paciente em propagandas e publicidades – Manual de publicidade médica (Resolução nº 1.974/11)”

postado em: Coluna da Zafalão

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Em uma época de extrema preocupação com autodeterminação informacional do indivíduo, ou seja, com a indispensável garantia do poder de se saber exatamente tudo a respeito do tratamento de seus dados pessoais, todos os profissionais devem estar atentos para que evitem o cometimento de transgressões por falta de conhecimento, uma vez que ninguém pode alegar o desconhecimento da lei (art. 3º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).

Nesse cenário também se inserem os profissionais das atividades intelectuais, como os médicos. Ora, sabemos que a atividade médica não pode se confundir com a atividade empresarial, sob pena de desvirtuamento de seus fins e, por isso mesmo, deve se atentar às legislações que a regulam.

Nesse sentido, com o objetivo de regular e controlar a divulgação de assuntos médicos em compasso com a velocidade da informação e a gama de meios midiáticos contemporânea, bem como como fortalecer a ética no exercício de tão nobre profissão e garantir o controle e seriedade da propaganda e publicidade médica, surgiu a Resolução nº 1.974/2011, conhecida como Manual de Publicidade Médica. Vale lembrar que Código de Ética Médica (Resolução CFM nº 2217/2018) também abarca esse tema, de forma geral.

As legislações citadas têm por fito garantir a perpetuidade de princípios e valores médicos, além de atuar como obstáculos da autopromoção desenfreada, do sensacionalismo e, conforme já explanado, da mercantilização da profissão, capazes de comprometer, inclusive, o bem-estar da sociedade.

Pois bem, de forma tímida- se comparada com o Manual de Publicidade Médica-, o Código de Ética Médica supra citado dispõe em seu “Capítulo XVIII – Da Publicidade Médica”, por exemplo, que é vedado ao médico: “Art. 111. Permitir que sua participação na divulgação de assuntos médicos, em qualquer meio de comunicação de massa, deixe de ter caráter exclusivamente de esclarecimento e educação da sociedade”; e “Art. 112. Divulgar informação sobre assunto médico de forma sensacionalista, promocional ou de conteúdo inverídico.”, dentre outras disposições de extrema relevância.

Por sua vez, o Manual de Publicidade Médica já em seu artigo 3º, alínea “g”, aduz que é vedado ao médico: “g) Expor a figura de seu paciente como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento, ainda que com autorização expressa do mesmo, ressalvado o disposto no art. 10 desta resolução; (…).”. Adiante, no retro citado artigo 10º que: “Art. 10 Nos trabalhos e eventos científicos em que a exposição de figura de paciente for imprescindível, o médico deverá obter prévia autorização expressa do mesmo ou de seu representante legal.”.

Diante dos citados dispositivos acerca da imagem do paciente, é possível se inferir que somente deve ser utilizada quando imprescindível e em trabalhos e eventos científicos, desde que autorizado previamente pelo paciente- sendo que todo uso de imagem deve enfatizar apenas a assistência. Sugere-se que esta autorização se dê de forma expressa e que seja devida e previamente informado ao paciente toda a extensão e motivação de seu uso, já que o consentimento deve ser livre, informado e inequívoco.

Nesse sentido o artigo 9º determina que “por ocasião das entrevistas, comunicações, publicações de artigos e informações ao público, o médico deve evitar sua autopromoção e sensacionalismo, preservando, sempre, o decoro da profissão”, sendo que entende-se por sensacionalismo: “f) Usar de forma abusiva, enganosa ou sedutora representações visuais e informações que possam induzir a promessas de resultados.”.

Adiante, ainda no Manual de Publicidade Médica, o item “6. Das Proibições Gerais” introduz que, in verbis: “De modo geral, na propaganda ou publicidade de serviços médicos e na exposição na imprensa ao médico ou aos serviços médicos é vedado: (…) IV – apresentar nome, imagem e/ou voz de pessoa leiga em medicina, cujas características sejam facilmente reconhecidas pelo público em razão de sua celebridade, afirmando ou sugerindo que ela utiliza os serviços do médico ou do estabelecimento de saúde ou recomendando seu uso; (…) VII – apresentar de forma abusiva, enganosa ou sedutora representações visuais das alterações do corpo humano causadas por supostos tratamento ou submissão a tratamento; todo uso de imagem deve enfatizar apenas a assistência; (…) IX – fazer uso de peças de propaganda e/ou publicidade médica – independentemente da mídia utilizada para sua veiculação – nas quais se apresentem designações, símbolos, figuras, desenhos, imagens, slogans e quaisquer argumentos que sugiram garantia de resultados e percepção de êxito/sucesso pessoal do paciente atreladas ao uso dos serviços de determinado médico ou unidade de saúde; (…).”.

Ainda, no item 5 do ANEXO I deste Manual, o qual discorre sobre “Critérios para a relação dos médicos com a imprensa (programas de TV e rádio, jornais, revistas), no uso das redes sociais e na participação em eventos (congressos, conferências, fóruns, seminários etc.)”, verifica-se a determinação de que, ipsis litteris: “É vedado ao médico, na relação com a imprensa, na participação em eventos e no uso das redes sociais: (…) o) expor a figura de paciente como forma de divulgar técnica, método ou resultado de tratamento; (…)”.

Outrossim, em seu final, o Manual em questão traz listadas 32 (trinta e duas) perguntas e respostas relacionadas a dúvidas frequentes, para ajudar o leitor a compreender o tema. Dentre estas, sobre a questão ora abordada, se faz indispensável verificar as de número 15 e 16. Vejamos:

“15. É permitido utilizar fotos de pacientes para demonstrar o resultado de tratamentos ou para algum outro fim promocional? Não. O uso da imagem de pacientes é expressamente proibido, mesmo com autorização do paciente.

16. Vou apresentar um artigo em um congresso. Gostaria de usar fotos. A resolução permite? Quando imprescindível, o uso da imagem em trabalhos e eventos científicos é permitido, desde que autorizado previamente pelo paciente.”

Sabemos o quanto é difícil prever e até mesmo reparar eventuais danos causados por informações, dados e imagens espalhadas pelos meios de comunicação- ainda mais no atual cenário mundial em que as informações percorrem o globo na velocidade da luz-, por isso, é melhor prevenir do que remediar!

Vivemos em uma época que a preocupação com os dados dos outros deve sempre preceder qualquer ação de marketing, com vistas a evitar danos e efeitos que podemos ainda sequer conhecer.

Por fim, conforme o próprio Manual de publicidade médica (Resolução nº 1.974/11) indica em sua última pergunta e resposta:

“32. Tenho dúvidas sobre a aplicação das regras. O que devo fazer? Você deve contatar a Codame de seu CRM. Uma das atribuições dessa comissão é responder consultas relacionadas à publicidade.”.

*CODAME – Comissão de Divulgação de Assuntos Médicos.

 

Autora: Elisa Zafalão – Advogada, graduada pela Universidade Federal de Goiás – UFG e Pós-Graduanda em Direito Público pela Instituição Damásio Educacional, atuante nas áreas Cível e Administrativo. Email: elisazafalao@gmail.com.

A advogada Elisa Zafalão escreve periodicamente para o SaudeOcupacional.org, na “Coluna da Zafalão”.

Obs.: esse texto traduz a opinião pessoal da colunista, não sendo uma opinião institucional do SaudeOcupacional.org.

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