Em tentativa de unificação de entendimento, peritos médicos judiciais deliberaram no último dia 25/01/2023 diversas questões atinentes à visita técnica que objetiva estabelecer o nexo técnico entre o hipotético agravo sofrido pelo trabalhador e o seu respectivo trabalho. Confira!
“I Consenso Médico-Pericial da Noroeste Paulista
Metodologia Pericial: Vistoria do Posto de Trabalho na avaliação do nexo causal entre agravo à saúde e trabalho.
ATA DA REUNIÃO VIRTUAL DOS MÉDICOS PERITOS DA NOROESTE DO ESTADO DE SÃO PAULO REALIZADA NO DIA 25 DE JANEIRO DE 2023
No dia 25 de janeiro de 2023 realizou-se, a partir das 19hs, a reunião do Grupo de Médicos Peritos da Noroeste do Estado de São Paulo, de forma virtual através da ferramenta GOOGLE MEET, sob a coordenação do médico perito João Carlos D’ Elia, tendo como pauta a apresentação do tema “Metodologia Pericial: Vistoria do Posto de Trabalho” pelo Dr. Marcos Antonio Alvarez, membro da Diretoria Estadual de São Paulo da ABMLPM.
Feita a apresentação em 40 minutos seguida de debate entre os participantes, houve convergência para uma proposta de CONSENSO sobre o tema, com votação e aprovação por unanimidade, finalizada e escrita com o seguinte teor:
Os médicos peritos da região Noroeste do Estado de São Paulo, reunidos virtualmente no dia 25 de janeiro de 2023, CONSIDERANDO QUE:
- A nomeação de Perito em processos judiciais é prerrogativa discricionária do Juiz quando a prova do fato depender de conhecimento técnico ou científico (Lei 13.105 de 16/03/2015 – CPC – Artigo 156)
- O laudo pericial deverá demonstrar que o método utilizado é o predominante aceito pelos especialistas da área de conhecimento da qual se originou, a exposição do objeto da perícia e indicar como alcançou suas conclusões (Artigo 473, Inciso III, I e §1º do CPC, respectivamente)
- A perícia médica é ato privativo do médico (Lei 12.842/2013)
- O Médico investido na função de Perito do Juízo possui as prerrogativas do livre exercício profissional com autonomia para realização de seu mister (Código de Ética Médica – Resolução do CFM 2.217/2018 modificada pelas Resoluções 2222/2018 e 2226/2019) – Capítulo I – princípios fundamentais:
VII –O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.
VIII –O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho
- A Resolução do CFM de nº 2.056/2013 estabelece em seu capítulo XII (Das Perícias Médicas e Médico-Legais)
Art. 52. Os médicos peritos estão submetidos aos princípios éticos da imparcialidade, do respeito à pessoa, da veracidade, da objetividade e da qualificação profissional.
Parágrafo único. O ato pericial em Medicina é privativo de médico, nos termos da Lei nº 12.842/13.
Art. 58. Fica definido como ROTEIRO BÁSICO DO RELATÓRIO PERICIAL o que segue abaixo:
a) Preâmbulo. Auto apresentação do perito, na qual informa sobre sua qualificação profissional na matéria em discussão;
b) Individualização da perícia. Detalhes objetivos sobre o processo e as partes envolvidas;
c) Circunstâncias do exame pericial. Descrição objetiva dos procedimentos realizados (entrevistados, número de entrevistas, tempo dispendido, documentos examinados, exames complementares etc.);
d) Identificação do examinando. Nome e qualificação completa da pessoa que foi alvo dos procedimentos periciais;
e) História da doença atual. Relato do adoecimento, início, principais sinais e sintomas, tempo de duração, forma de evolução, consequências, tratamentos realizados, internações, outras informações relevantes;
f) História pessoal. Síntese da história de vida do examinando, com ênfase na sua relação com o objeto da perícia, se houver;
g) História psiquiátrica prévia (em perícias psiquiátricas). Relato dos contatos psiquiátricos prévios; em especial, tratamentos e hospitalizações;
h) História médica. Relato das doenças clínicas e cirúrgicas atuais e prévias, incluindo tratamentos e hospitalizações;
i) História familiar. Registro das doenças prevalentes nos familiares próximos;
j) Exame físico. Descrição da condição clínica geral do examinando;
k) Exame do estado mental (em perícias psiquiátricas e neurológicas). Descrição das funções psíquicas do examinando;
l) Exames e avaliações complementares. Descrição de achados laboratoriais e de resultados de exames e testes aplicados;
m) Diagnóstico positivo. Segundo a nosografia preconizada pela Organização Mundial da Saúde, oficialmente adotada pelo Brasil;
n) Comentários médico-legais. Esclarecimento sobre a relação entre a conclusão médica e as normas legais que disciplinam o assunto em debate;
o) Conclusão. Frase curta e direta que sintetiza todo o pensamento do perito;
p) Resposta aos quesitos. Respostas claras, concisas e objetivas.
- A avaliação de nexo causal entre agravo a saúde e trabalho é feita por critérios de nexo causal aceitos internacionalmente, aplicados a partir da etiopatogenia do agravo diagnosticado pelo médico perito.
- A realização de avaliação ergonômica sem objetivo definido pela perícia médica gera tumulto processual e raramente é útil na solução da lide.
- A Resolução do CFM de nº 2323/2022 estabelece em seu Artigo 2º:
Art. 2º Para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além da anamnese, do exame clínico presencial (físico e mental), de relatórios e de exames complementares, é dever do médico considerar: (g. n.)
I – A história clínica e ocupacional atual e pregressa, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal;
II – O estudo do local de trabalho;
III – O estudo da organização do trabalho;
IV – Os dados epidemiológicos;
V – A literatura científica;
VI – A ocorrência de quadro clínico ou subclínico em trabalhadores expostos a riscos semelhantes;
VII – A identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes e outros;
VIII – O depoimento e a experiência dos trabalhadores;
IX – Os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais, sejam ou não da área da saúde.
Parágrafo único. Ao médico assistente é vedado determinar nexo causal entre doença e trabalho sem observar o contido neste artigo e seus incisos.
E ainda CONSIDERANDO QUE:
- A Metodologia pericial é matéria técnico cientifica definida por especialistas, fato reconhecido pela legislação a ponto de ter que constar no laudo pericial (Artigo 473, Inciso III do CPC):
- O caput do art. 2º da Resolução CFM 2323/2022 determina que o médico deve considerar não sendo possível substituir o considerar por realizar.
- A substituição de “considerar” por “realizar”, cria situação impossível de ser cumprida uma vez que vistoria não é meio capaz de produzir todas as fontes de informações citada nos incisos, como por exemplo, literatura científica.
- Estudo do local de trabalho é o conjunto das normas de saúde e segurança determinadas legalmente, não se confundindo com vistoria do posto de trabalho, procedimento processual.
- O médico perito tem a sua disposição outras fontes de informação além das citadas na Res. 2323/2022 como, por exemplo, os documentos encartados, outras perícias realizadas no processo, informações oriundas de documentos que a legislação permite que o perito solicite (art. 473, §3º do CPC), frutos da experiencia do profissional com o assunto debatido no caso concreto, oriundas de ato processual por ele solicitado, como Vistoria do posto de trabalho.
- O artigo 2º da Resolução do CFM 2323/2022 não trata de fontes de informações disponíveis apenas ao médico perito como vistoria do local de trabalho, solicitação de documentos públicos ou privados, etc.
- A Vistoria de posto de trabalho é fonte limitada de informação não tendo o condão de substituir as informações que podem ser obtidas através das fontes a disposição do perito.
- A Vistoria de posto de trabalho envolve outras áreas de conhecimento além da médica.
- O Médico perito não deve realizar avaliação para a qual não está capacitado
- Desta forma, não é possível interpretar que a Resolução 2323/2022 do CFM obrigue o médico perito a realizar vistoria do posto de trabalho.
PORTANTO, COM BASE NAS PREMISSAS TÉCNICO CIENTÍFICAS, LEGAIS E ÉTICAS SUPRACITADAS, ESTABELECEM CONSENSUALMENTE, POR UNANIMIDADE, A SEGUINTE METODOLOGIA PARA A VISTORIA DO POSTO DE TRABALHO NA ANÁLISE DE NEXO CAUSAL ENTRE AGRAVO A SAÚDE E TRABALHO:
1. Cabe exclusivamente ao médico perito indicar a necessidade de Vistoria do Local de Trabalho para conclusão do laudo médico pericial.
2. A Vistoria do Posto de Trabalho não faz parte do ato médico e quando for necessária, deverá ser remunerada à parte e em valor independente da perícia médica.
3. Quando solicitar ao juízo a realização de Vistoria do Local de Trabalho, o médico perito deverá especificar o objeto da vistoria com base na etiopatogenia do agravo à saúde diagnosticado no ato pericial.
4. A Vistoria do Local de Trabalho pode ser indicada, se o perito entender necessária, após ter elaborado o diagnóstico pericial e considerado as informações à sua disposição, o que ocorre, normalmente, após a perícia médica.
5. Cabe ao médico perito informar ao juízo se é capacitado para realizar a vistoria de local de trabalho por ele indicada.”