Por força de nossa atividade profissional realizamos visitas e vistorias em diversas empresas, dos mais diferentes ramos da atividade econômica.
Em razão disto temos contato direto com o “chão de fábrica”, trabalhadores que estão na linha de frente das empresas, envolvidos diretamente com o processo produtivo, e, claramente, notamos a utilização de EPI’s por estes trabalhadores.
Muito difícil observarmos nestas vistorias trabalhadores que não estão usando nenhum EPI. Isto decorre de uma maior conscientização de todos sobre os riscos existentes no meio ambiente de trabalho e até mesmo por força da legislação e de fiscalizações.
É amplamente conhecida e divulgada a necessidade de fornecimento de equipamentos de proteção individual aos colaboradores das empresas.
Contudo, nem sempre esta impressão de uso de EPIs de nosso dia-a-dia é confirmada nas ações trabalhistas.
Na prática, muitas empresas são condenadas a pagar adicional de insalubridade como se não tivessem fornecido EPIs aos seus colaboradores.
Diante deste cenário, qual o motivo desta incongruência?
Isto decorre claramente do desconhecimento e negligência das empresas, e de muitos profissionais que atuam na área de saúde e segurança no trabalho, sobre as exigências da NR-06 quanto ao fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual.
A NR-06 estabelece quanto as obrigações do Empregador:
6.6.1 Cabe ao empregador quanto ao EPI:
a) adquirir o adequado ao risco de cada atividade;
b) exigir seu uso;
c) fornecer ao trabalhador somente o aprovado pelo órgãonacional competente em matéria de segurança e saúde no trabalho;
d) orientar e treinar o trabalhador sobre o uso adequado, guarda e conservação;
e) substituir imediatamente, quando danificado ou extraviado;
f) responsabilizar-se pela higienização e manutenção periódica; e,
g) comunicar ao MTE qualquer irregularidade observada.
h) registrar o seu fornecimento ao trabalhador, podendo ser adotados livros, fichas ou sistema eletrônico.
Como podemos observar no trecho da NR-06 transcrito acima, não basta o fornecimento, deve o mesmo ser adequado ao risco, ter seu uso exigido, estar aprovado pelo MTE, ter sido o trabalhador orientado e treinado, ser substituído quando necessário e ter seu fornecimento registrado
Este é o entendimento também da Justiça do Trabalho, havendo entendimento majoritário de nossos tribunais neste sentido:
AGRAVO DE INSTRUMENTO – DESPROVIMENTO – ADICIONAL DE INSALUBRIDADE – FORNECIMENTO DE EPI Para que o empregador quede exonerado do pagamento do adicional de insalubridade, não basta o fornecimento do equipamento de proteção individual. É preciso que o aludido equipamento tenha utilização e manutenção regulares, atingindo o objetivo de conseguir eliminar, ou reduzir a um grau aceitável, os efeitos do agente insalubre sobre o organismo do trabalhador. Inteligência da Súmula nº 289/TST. Agravo de Instrumento a que se nega provimento. (TST – AIRR: 2238402520035060142 223840-25.2003.5.06.0142, Relator: Maria Cristina Irigoyen Peduzzi, Data de Julgamento: 23/08/2006, 3ª Turma,, Data de Publicação: DJ 15/09/2006.)
DA CULPA DO EMPREGADOR PELO ACIDENTE SOFRIDO PELO EMPREGADO – FORNECIMENTO DE EPIS SEM PROVA QUANTO À FISCALIZAÇÃO DO USO DO EQUIPAMENTO Não basta ao empregador fornecer o EPI para o empregado, sendo mister a fiscalização, por parte da empresa, do uso do equipamento. O fato de a primeira reclamada fornecer protetor de rosto para o reclamante, ‘de per si’, não a exime da responsabilidade pelo acidente que vitimou o obreiro, mormente quando não há provas nos autos de que ela exigia o cumprimento das normas gerais de segurança por seus trabalhadores. Tenho, pois, como demonstrada a culpa da reclamada pelo acidente sofrido pelo reclamante. Recurso ordinário a que se nega provimento, neste aspecto. (TRT-2 – RO: 00044001020085020030 SP 00044001020085020030 A20, Relator: MARIA CRISTINA FISCH, Data de Julgamento: 04/09/2013, 18ª TURMA, Data de Publicação: 06/09/2013)
O fato de a reclamada fornecer os EPI’s, por si só, não desconfigura a insalubridade, já que a reclamada tinha o dever de fiscalizar o correto uso dos EPI’s. Não basta apenas o fornecimento, sem a fiscalização do efetivo uso (Súmula 289 do C. TST). (TRT-2 – RO: 3084200546602000 SP 03084-2005-466-02-00-0, Relator: SERGIO J. B. JUNQUEIRA MACHADO, Data de Julgamento: 21/07/2009, 3ª TURMA, Data de Publicação: 04/08/2009)
Adicional de Insalubridade. Fornecimento de EPI’s. Não basta o fornecimento dos EPIs, é preciso que a empresa atenda às exigências contidas na Norma Regulamentadora n. 6 (NR-6),da portaria n. 3.214/78, do Ministério do Trabalho.(TRT-2 – RECORD: 1590200737202000 SP 01590-2007-372-02-00-0, Relator: SILVIA REGINA PONDÉ GALVAO DEVONALD, Data de Julgamento: 28/07/2009, 3ª TURMA, Data de Publicação: 14/08/2009)
O que observamos é que muitas empresas fornecem EPIs a seus colaboradores, mas não cumprem a contento o que está disciplinado na NR-06.
Fornecer e não cumprir o que determina a NR-06 é o mesmo que não fornecer, desta forma as empresas estão simplesmente gastando dinheiro sem qualquer efetividade na proteção do trabalhador e em sua defesa na Justiça do Trabalho.
Estas exigências da NR-06 não são mera formalidade, mas obrigações necessárias à efetiva proteção do trabalhador, possibilitando que os mesmos não sejam expostos a agentes ambientais.
Como um trabalhador que não foi treinado para o uso correto do EPI pode saber a forma correta de retirar uma luva de proteção sem ter contato com o agente químico?
Como um trabalhador estará protegido contra óleos minerais se a luva de proteção fornecida não é capaz de neutralizar este agente?
São dois questionamentos que evidenciam a importância das empresas observarem o que está disposto na NR-06, seja para proteger seu colaborador contra agentes nocivos, seja para não ser posteriormente condenada a pagar o adicional de insalubridade na Justiça do Trabalho.
Em alguns casos a empresa deixa de fazer o registro adequado do cumprimento das exigências da NR-06.
Este ponto é fundamental, pois o registro do fornecimento é muito importante para posterior comprovação na Justiça do Trabalho.
Esta é uma das situações mais frustrantes que se pode enfrentar, fornecimento adequado sem ter como comprova-lo.
Desta forma fica evidente que as empresas devem estar atentas ao cumprimento da NR-06, não bastando o mero fornecimento do EPI.
Saúde e Segurança no Trabalho devem ser encarados pelas empresas como investimento e não como custo, mas para que este investimento tenha retorno, torna-se necessário que o mesmo seja realizado de forma adequada e dentro das exigências legais.
Autor (a): Dr. João Baptista Opitz Neto – Médico do Trabalho; Especialista em Ergonomia; Especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas. Mestrando em Bioética pela UMSA / Argentina. Perito Judicial / Assistente Técnico nas áreas trabalhista e previdenciária. Autor do livro “Perícia Médica no Direito” (Editora Rideel).
O Dr. João Baptista Opitz Neto escreve mensalmente para o SaudeOcupacional.org, na “Coluna do Opitz”.