Este é um tema muito polêmico e que gera muitas dúvidas na atuação do médico na Justiça do Trabalho.
O fato de haver uma Comunicação de Acidente de Trabalho emitida, seja pela empresa ou por outros que legalmente podem emiti-la, é prova inequívoca do acidente de trabalho ou de situações equiparadas a ele?
O perito médico atuando na Justiça do Trabalho deve considerar o nexo causal entre uma doença e um trabalho apenas por existir uma CAT emitida?
Primeiramente, devemos analisar em que situações a CAT deve ser emitida.
Segundo nossa legislação, a CAT deve ser emitida quando existir a confirmação ou a suspeita de um acidente de trabalho ou das situações legais equiparadas a ele, como as doenças do trabalho, acidentes de trajeto e etc.
Vejamos o dispositivo legal que trata da obrigatoriedade da emissão da CAT:
Lei 8213/91
Art. 22. A empresa ou o empregador doméstico deverão comunicar o acidente do trabalho à Previdência Social até o primeiro dia útil seguinte ao da ocorrência e, em caso de morte, de imediato, à autoridade competente, sob pena de multa variável entre o limite mínimo e o limite máximo do salário de contribuição, sucessivamente aumentada nas reincidências, aplicada e cobrada pela Previdência Social.
Os mais diferentes doutrinadores e a literatura especializada estabelecem que a Comunicação de Acidente de Trabalho também deve ser emitida na suspeita de doença relacionada ao trabalho.
Isto nos indica que um médico pode emitir a CAT sem ter a certeza diagnostica do acidente de trabalho.
Portanto, entendo que a CAT emitida, seja por quem quer que seja, não é prova inequívoca do nexo causal, podendo haver prova em contrário.
E é este o ponto que o perito judicial deve observar.
Como já destaquei em artigos anteriores, sendo este meu entendimento sobre a prova pericial, a mesma deve-se limitar a materia controversa medica em discussão na lide, devendo o perito medico observar qual o objeto de sua analise, que necessariamente deve ser fixado pelo Juízo.
É isto que está estabelecido no inciso I e parágrafo segundo do artigo 473 do CPC:
Art. 473. O laudo pericial deverá conter:
I – a exposição do objeto da perícia;
…
§ 2o É vedado ao perito ultrapassar os limites de sua designação, bem como emitir opiniões pessoais que excedam o exame técnico ou científico do objeto da perícia.
Como podemos observar, o legislador foi claro ao estabelecer que é defeso ao perito judicial extrapolar o objeto da pericia, não podendo ultrapassar os limites de sua designação.
Neste sentido, quem determina qual será o objeto da perícia médica é o Juízo, fato que o médico perito nunca deve perder de vista.
E porque isto é importante na questão da CAT emitida e a avaliação pericial?
É justamente o objeto da pericia medica que irá nortear a conduta do Expert frente a esta situação.
O Juízo pode estar convencido, por outros meios de prova, que de fato o acidente de trabalho ocorreu ou a doença relaciona-se ao trabalho, determinando que o perito medico apenas análise as consequências médicas deste acidente/doença.
Por outro lado, o magistrado pode entender ser necessário que o médico perito análise a real ocorrência do acidente de trabalho/doença ocupacional, determinado que o nexo causal também seja analisado.
Quem fixa o ponto controvertido e o que precisa ser esclarecido, obrigatoriamente, é o magistrado, não cabendo ao Expert fazer aquilo que entende, mas sim o que foi determinado.
Não compete ao perito judicial realizar qualquer tipo de aplicação do direito, apenas esclarecer fatos médicos controvertidos de interesse processual.
Imaginemos um caso, hipotético, onde o Reclamante afirma que sofreu acidente de trabalho e a empresa não discorda desta alegação, cabe ao perito medico analisar se o acidente de trabalho ocorreu?
O acidente de trabalho, neste caso, é ponto controvertido?
A resposta nos parece óbvia.
Agora, se o Juízo solicitou a análise da existência do nexo causal, não pode a emissão da CAT ser o embasamento para o estabelecimento do nexo, devendo o Jurisperitos analisar tecnicamente se o nexo causal existe.
Uma tendinite não tem relação com o trabalho apenas pela existência da CAT, mas sim porque analisando o ambiente de trabalho, tecnicamente, existem razões para o estabelecimento do nexo causal.
Retornando a pergunta do início deste artigo, o quem define se a CAT é prova do acidente de trabalho é o Juízo, não o perito medico.
Cabe ao perito médico observar o que foi determinado em sua designação e cumprir com seu mister.
Se o Juízo fixar como ponto controvertido o estabelecimento do nexo causal, o perito médico deve utilizar metodologia técnica para a análise de tal relação e não apenas afirmar que existe CAT emitida, o que supostamente comprova o nexo causal.
Feliz aquele que transfere o que sabe e aprende o que ensina.
Cora Coralina
Autor (a): Dr. João Baptista Opitz Neto – Médico do Trabalho; Especialista em Ergonomia; Especialista em Medicina Legal e Perícias Médicas. Mestrando em Bioética pela UMSA / Argentina. Perito Judicial / Assistente Técnico nas áreas trabalhista e previdenciária. Autor do livro “Perícia Médica no Direito” (Editora Rideel).
O Dr. João Baptista Opitz Neto escreve mensalmente para o SaudeOcupacional.org, na “Coluna do Opitz”.