20 out 2017

Como a segurança e a saúde dividem o indivíduo?

postado em: Coluna do Edu

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Sou formado há 22 anos e atuo na área de Segurança e Saúde há pelo menos 20 anos. O que me chamou atenção ao longo destes anos é que a Segurança e a Saúde segregam, fragmentam, dividem o indivíduo o tempo todo.

Vamos começar pela separação institucional.

Quantas e quantas vezes ouvi (até mesmo falei) “Isto é com a segurança!” ou “Isto é com a saúde!”. Um detalhe: o indivíduo é o mesmo. Boa parte das empresas têm procedimentos de segurança impecáveis. Os trabalhadores até parecem “doutrinados” sempre estacionando de ré, pegando no corrimão das escadas, utilizando todos os EPI, analisando os riscos antes das tarefas, etc., porém, se este mesmo trabalhador, estiver com o colesterol alto, a pressão alterada ou um pouco fora do peso, não há problema! Ele continua a trabalhar com “segurança”.

Nós médicos jamais revelaremos informações das consultas, mas aqui começa a segunda separação, os programas legais e/ou de qualidade de vida não se falam. Não poderíamos “abrir um desvio”, como acontece com os desvios da segurança, quando um trabalhador apresentasse algumas destas alterações? Os “workflows”, evidentemente, só ficariam entre a equipe de saúde e o trabalhador. Seriam eles: “Já tomou seu remédio?”, “Já fez seus 30 minutinhos de atividade física?”, “Está bebendo menos?”, entre outros. A própria empresa “cobra” muito mais os resultados da segurança do que da saúde. Em outra boa parte das empresas os resultados da segurança fazem parte dos indicadores que impactarão na remuneração variável, resultado: excelentes números de acidentes de trabalho e doenças profissionais e péssimos números de sinistralidade, mortes por câncer e doenças cardiovasculares. Temos que ser cuidadosos ao propor indicadores de saúde nas remunerações variáveis, mas não podemos é ficar totalmente paralisados sobre esta discussão. Alguém já disse: a famosa “paralisia de paradigma”. O paradigma existe e ficamos totalmente paralisados diante dele.

Ainda temos a separação na própria saúde ocupacional. Não há como separar o ocupacional do assistencial. Sei que muitos colegas vão dizer: não tenho tempo para os dois! Vivemos assim um ciclo extremamente perverso e vicioso.

As empresas não conseguem enxergar a importância do assistencial e o pior, nós ampliamos essa “miopia empresarial”. Os vínculos empregatícios dos médicos com as empresas precisam melhorar, mas para que isto aconteça temos que mostrar resultado. As empresas que deixam de investir na medicina assistencial “in company” estão perdendo dinheiro. Recentemente fizemos a estimativa do retorno financeiro da implantação do que chamamos de “In Company Clinic” (nome pomposo para o nosso popular ambulatório), cujo investimento em dois anos seria de R$ 624.000,00, mas o retorno seria de 135%, ou seja, para cada R$ 1,00 investido, teremos um retorno estimado de R$ 2,35. Só saliento um detalhe: a liderança desse projeto tem que ser da Saúde Ocupacional, especialmente com a participação do médico do trabalho. O médico do trabalho não pode ficar na periferia deste processo.

Voltando nas separações, mais uma muito comum. Com a grande prevalência de transtornos mentais e comportamentais, outra separação constante é da vida pessoal com a profissional. Recomendo as empresas, numa primeira abordagem, a focarem na questão organizacional. Só após terem controlado, pelos menos em parte, os fatores de risco psicossociais, recomendo apoiar o trabalhador nas questões pessoais. Não há como separar. Temos visto com certa frequência o problema pessoal (financeiro, álcool e drogas) terem um impacto significativo na vida profissional do trabalhador.

Por fim a separação ainda mais complexa, pois geralmente as lideranças são diferentes. Benefícios estão com o RH, incluindo a sinistralidade e o programa de bem-estar. Quando nós médicos do trabalho dizemos “qualidade de vida não é comigo” ou “sinistralidade não é comigo” ele sofre da “Síndrome de Jack”, ele não só separa o indivíduo, ele simplesmente o dilacera. Não é um “tiro no pé” é um “tiro no joelho”.

Invista em bem-estar!

Autor (a): Dr. Eduardo Arantes – Médico com especialização em Medicina do Trabalho pela Universidade São Francisco de São Paulo, Ergonomia pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e em Gestão de Saúde pela FGV. Autor dos livros: O Retorno Financeiro de Programas de Promoção da Segurança, Saúde e Qualidade de Vida nas Empresas, Ciências da Vida Humana e o recém-lançado Crônicas de Saúde, Ciência e Cotidiano. Atualmente é Diretor Técnico na Beecorp – Bem Estar Corporativo.

O Dr. Eduardo Arantes escreve mensalmente para o SaudeOcupacional.org, na “Coluna do Edu”.

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