Prezado e Prezada leitora, porque o dia a dia do médico do trabalho é tão complexo? Pela manhã estamos fazendo ajustes no PCMSO, atendendo a casos ocupacionais e assistenciais, a tarde avaliando dados complexos de sinistralidade e à noite, por vezes, sendo acordado para acompanhar algum caso mais grave seja de acidente ou de doença. Ainda somos uma grande referência dentro das empresas.
A Medicina do Trabalho, especialidade ligada a Saúde Pública é uma das mais intrigantes especializações. Como melhorar as condições de vida e saúde dos trabalhadores equilibrando interesses destes, dos empresários, sindicatos e sociedade? Muitos stakeholders para uma só especialidade. A carga de responsabilidades do médico do trabalho é imensa. Quem é mais reivindicativo: o trabalhador ou o empresário? Fazer a articulação entre as necessidades individuais e coletivas dos trabalhadores e as necessidades sociais, econômicas e administrativas da produção não é uma tarefa fácil.
Quando me decidi pela especialidade estabeleci um tripé para nortear minha atuação: Ética, Conhecimento Científico e Coração. No início achava que agindo com ética e utilizando todo o conhecimento científico já era suficiente, porém com a maturidade, descobri que muitas decisões necessitavam mais da voz do meu coração.
Lá se vão mais de vinte anos. Acho pouco. Sempre quando penso que já vi de tudo, surgem dezenas de situações novas a cada ano. Nossa vida profissional precisa, além de “extensidade”, de intensidade e estes anos foram período muito intensos, algumas vezes doloroso e muitas vezes feliz. Ter iniciado minha carreira de médico do trabalho fazendo o que chamei de Medicina do Trabalho “offroad” foi muito bom, pois atender a trabalhadores nas mais difíceis condições, deixou-me mais apto a reivindicar programas para o CEO da empresa.
Algumas dicas de sobrevivência. Saiba ouvir, registre tudo e escreva a verdade, sempre. Só para lembrar, o prontuário não é seu. Você não é o dono da verdade. Não temos mais a prática hegemônica da medicina, especialmente a medicina do trabalho. Cuidado com os principais erros do profissional de saúde e segurança no trabalho:
1. “Aqui quem manda é eu”.
2. Não agir como facilitador. Trabalhe para seus liderados e pares. Você faz parte de um time.
3. Ocultar a verdade! Compartilhe e não prometa o que não fará.
4. Querer controlar as pessoas.
5. Enfatizar o negativo.
6. “Eu sempre estou certo”.
7. Tenha tolerância ao erro honesto.
8. E o pior erro é não o reconhecer.
9. Não mudar seus modelos mentais.
10. Escolher “um lado”.
Um bom equipamento para seu setor de trabalho é uma fotocopiadora e/ou impressora. Tire cópia de todos os exames e relatórios. Um dia eles serão importantes para o trabalhador e para a empresa.
Seja uma caixa de ressonância para tudo que acontece na empresa. Bom ou ruim. Mas cuidado para não ser uma caixa de amplificação.
Capriche no admissional e no primeiro periódico. Além de repetir a audiometria 6 meses após a admissão, tenho recomendado realizar um periódico completo nesta data. Apresentou absenteísmo no período? Como está sua sinistralidade? Surgiram doenças não relacionadas na admissão?
Viva (e sobreviva) da saúde da empresa e não da doença e faça de cada funcionário o agente de sua própria saúde. Você deve ser um bom exemplo. Apenas um bom exemplo, não um herói ou celibatário. Lembre-se que a medicina é uma atividade de meios e a empresa só é lucrativa com empregados saudáveis.
Invista em bem-estar.
Autor (a): Dr. Eduardo Arantes – Médico com especialização em Medicina do Trabalho pela Universidade São Francisco de São Paulo, Ergonomia pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais e em Gestão de Saúde pela FGV. Autor dos livros: O Retorno Financeiro de Programas de Promoção da Segurança, Saúde e Qualidade de Vida nas Empresas, Ciências da Vida Humana e o recém-lançado Crônicas de Saúde, Ciência e Cotidiano. Atualmente é Diretor Técnico na Beecorp – Bem Estar Corporativo.
O Dr. Eduardo Arantes escreve mensalmente para o SaudeOcupacional.org, na “Coluna do Edu”.