O juiz Mauro César Silva, titular da 1ª Vara do Trabalho de Nova Lima, condenou uma mineradora a pagar indenização por danos morais à companheira e aos três filhos de ex-empregado, vítima fatal de silicose. A mineradora foi condenada a pagar R$ 20 mil a cada um dos familiares, o que totaliza uma indenização no valor de R$ 80 mil.
O trabalhador morreu aos 66 anos, mais de 25 anos depois do encerramento do contrato de trabalho. A decisão reconheceu os chamados “danos morais reflexos”, o que significa que, embora o ato tenha sido praticado diretamente contra determinada pessoa, seus efeitos acabam por atingir, indiretamente, a integridade moral de terceiros. A situação é conhecida também por dano moral em ricochete.
A família contou que o trabalhador prestou serviços em atividade minerária, exposto a poeira de sílica a ponto de contrair silicose. A doença ocupacional teria sido adquirida em razão de não adoção de medidas preventivas pela empregadora. No entanto, ao se defender, a empresa sustentou que a causa do falecimento não foi silicose, mas outras doenças, sem nexo com o trabalho. O contrato de trabalho se encerrou em 15/9/1993.
Na sentença, o julgador, inicialmente, afastou a prescrição bienal, uma vez que a ação foi ajuizada em 15/3/2021 e o óbito ocorreu em 14/1/2021. Com relação à silicose, constatou estar registrada, na certidão de óbito, como sendo uma das causas da morte, entre outras doenças, incluindo a Covid-19. Mas outros documentos comprovaram que, após se submeter a diversos exames e perícias, inclusive no INSS, o empregado fora acometido de silicose. Ele, inclusive, recebeu benefício previdenciário específico e indenização por danos morais e materiais na esfera judicial.
Para o julgador, o quadro apurado impõe o dever de reparação. No caso, foram identificados o dano (óbito), o ilícito (exposição do trabalhador a ambiente insalubre) e o nexo de causalidade (concausa, tanto no surgimento da doença, quanto na causa da morte). A culpa da empresa foi reconhecida por não ter provado o cumprimento das normas de segurança do trabalho e a instrução do falecido, por meio de ordens de serviço, sobre as precauções a serem tomadas para evitar a doença (artigo 157 da CLT). O magistrado também considerou que a mineradora não provou a adoção de medidas efetivas para redução dos agentes nocivos à saúde (artigo 191 da CLT). Segundo a decisão, o ônus da prova era da empregadora, tendo em vista que somente ela possuía os meios de provar esses fatos (teoria da aptidão para prova).
A conclusão se baseou ainda na responsabilidade objetiva da empresa, ou seja, independentemente de culpa. Isso porque o dano decorreu do meio ambiente de trabalho (parágrafo 2º do artigo 225 e artigo 200, inciso VIII, ambos da Constituição) e a empresa desenvolvia atividade que expunha o trabalhador a risco excepcional à sua saúde (parágrafo único do artigo 927 do Código Civil), respondendo pelos riscos de sua atividade (artigo 2º da CLT).
O juiz presumiu a existência de danos morais experimentados pela companheira e filhos do trabalhador, diante do estado de sofrimento do familiar no decorrer da doença que, aos poucos, tirou-lhe a vida, assim como pela perda do ente querido. “É inegável a dor da ausência, a saudade, e mais, a tristeza e a angústia por ter sido a morte causada por omissão da empresa que, caso tivesse adotado medidas efetivas, poderia ter evitado o infortúnio.”, registrou na sentença.
Por considerar preenchidos os pressupostos dos artigos 186, 187 e 927 do Código Civil, condenou a mineradora a pagar R$ 20 mil a cada um dos familiares. Ao fixar o valor, o magistrado ponderou que o trabalhador morreu com 66 anos de idade, sendo que a expectativa de vida do brasileiro em 2018 era de 76,3 anos, conforme site oficial do IBGE. Outros aspectos também foram levados em consideração, como capacidade econômica das partes, efeito pedagógico da condenação e não enriquecimento sem causa.
Considerada a mais antiga e grave doença ocupacional conhecida, a silicose afeta indivíduos que inalam pó de sílica durante muitos anos. A sílica é o principal constituinte da areia, e, por essa razão, a exposição a essa substância é comum entre os trabalhadores de mineração. Normalmente, os sintomas manifestam-se muitos anos depois da exposição ao pó. Há recurso aguardando julgamento no TRT mineiro.
Fonte: TRT-3ª Região